Por que preferimos mexer no celular a conversar com uma pessoa nova?
Quando andamos sozinhos pelas ruas, pegamos ônibus ou resolvemos passear pelo shopping para dar aquela olhadinha nas vitrines, acabamos encontrando diversas pessoas estranhas, que não fazem parte da nossa vida, mas que, por culpa do acaso, acabam passando diante de nós, a todo o momento.
Nessas ocasiões, quando alguma pessoa estranha passa por você, qual é a sua reação padrão? Podemos tentar adivinhar? Você provavelmente desvia o olhar, abaixa a cabeça, talvez e, se for mais perito ainda em evitar contato com desconhecidos, tira logo o celular do bolso e da bolsa e checa as notificações do WhatsApp. Acertamos?
Antissocial, você? Imagina!
Ainda que o comportamento descrito acima possa ser considerado rude por algumas pessoas, é absolutamente normal que, diante de um estranho, você aja de maneira pouco receptiva – até mesmo porque, convenhamos, se fôssemos simpáticos com todas as pessoas estranhas que cruzam por nós durante o dia, não faríamos nada além de jogar conversa fora.
Já imaginou que bizarro se você desejasse “bom dia”, “boa tarde” e “boa noite” para todas as pessoas que passassem por você durante o dia, todos os dias? Mas essa nossa “antipatia” tem mais explicações além da óbvia de que não é possível cumprimentar todo mundo.
De acordo com o sociólogo Erving Goffman, especialista em interações sociais, há um conceito que precisa ser levado em conta nesse caso: a desatenção civil, que representa justamente o comportamento quase padrão de quem está diante de alguém que não conhece. A pessoa deixa claro que percebeu a presença da outra pessoa, e em seguida a ignora.
Mas então é uma falta de educação generalizada?
Não, claro que não. Seres humanos são criaturas complicadas e têm maneiras peculiares de garantir sua sobrevivência. Uma delas é isso de fingir que não estamos cientes da presença das outras pessoas à nossa volta ou do que elas estão fazendo. Essa é uma forma de garantir, digamos assim, a privacidade alheia e, já que é uma atitude recíproca, garantir a nossa privacidade também.
De acordo com Goffman, essa coisa de desatenção civil é também uma forma primária de interação social, afinal às vezes acontece uma troca breve de olhares, seguida de uma virada de cabeça ou sorrisos fracos, quando decidimos “cumprimentar” a pessoa. Em seguida, lá vem o celular, o escudo social da atualidade. Você pega o aparelho mesmo que nem queira usá-lo no momento. Depois disso, é cada um para um lado. Soa familiar, não é mesmo?
Esse tipo de interação mínima e discreta ao extremo é uma forma de garantirmos que a pessoa pela qual cruzamos na rua não nos representa perigo, assim como nós não representamos perigo a ela também. Viu só? É uma forma bem curiosa de autoproteção, no final das contas. É uma espécie de acordo social. Algo tipo “hey, cara, eu sei que você está aqui também, você sabe que estou aqui, agora vá fazer suas coisas que eu vou fazer as minhas”. E todo mundo fica bem.
Carão
No final das contas, esse contato mínimo é o que nos dá segurança, e quando não temos essa interação minúscula, não garantimos também a segurança de que tanto precisamos. Quando sabemos que alguém está vindo em nossa direção, olhamos para essa pessoa e em seguida desviamos o olhar, não significa que estamos fazendo “carão”. No fundo, é um jeito inconsciente de demonstrar respeito pela outra pessoa.
Esse tipo de comportamento é também uma forma de reconhecer o direito que cada pessoa tem de ficar sozinho. E é aquela coisa, né: quando reconhecemos o direito do outro, acabamos reconhecendo nosso próprio direito também. Funciona para tudo.
Goffman fala também sobre essa desatenção civil como uma forma de aprovar o comportamento alheio, de dizer, instintivamente, que não há nada de errado com isso e que não há razão para mudar a maneira de agir.
Outras formas de desatenção civil
Espertinhos que somos, às vezes usamos esse conceito de desatenção civil para outros motivos. Por exemplo: quando fazemos algo realmente constrangedor e sentimos a vontade de enfiar a cabeça em um buraco e sumir; ou quando testemunhamos alguém fazendo algo realmente constrangedor e sentimos a boa e velha “vergonha alheia”.
E se você ainda está duvidando da funcionalidade da desatenção civil, saiba que a ausência dela é bastante problemática, afinal nós enxergamos o “carão” como um comportamento natural e, inclusive, esperamos isso. Se alguém não age dessa maneira, nos sentimos ameaçados. É por isso que nos irritamos quando algum desconhecido nos olha fixamente e começa a prestar atenção em nossas conversas. E não é apenas uma questão de irritação: esse tipo de comportamento é também uma forma de ameaça implícita.
É por isso também que quando alguns rapazes inventam de, em pleno 2015, mexer com mulheres nas ruas, elas se sentem ameaçadas e nunca lisonjeadas. Na dúvida, apenas parem com o “fiu fiu”. E quanto aos homens, também é a falta de desatenção civil que faz com que alguns valentões partam para a briga apenas porque se incomodam com o olhar de alguém. E aí, você já tinha ouvido falar disso antes? Conte para a gente nos comentários!
FONTE(S)
- About/Nicki Lisa Cole
IMAGENS
- Shutterstock
- Pixabay
- Reprodução/R7
- Pixabay II
- Shutterstock II
Por que preferimos mexer no celular a conversar com uma pessoa nova?
Reviewed by Anônimo
on
17:17:00
Rating:
Nenhum comentário: